Porque está chovendo

boulevard-de-la-madeleine-1large

Boulevard de la Madeleine, Edouard Cortès

A julgar pelo nome deste blog e a frequência das postagens, chega-se facilmente à conclusão que tenho lido mais que amado – o que não deixa de ser verdade. Mas a principal razão dessa infrequência é que percebi que tenho publicado quase só poesia aqui, e quando criei este blog foi para exercitar a prosa; porque sou um poeta prenhe de prosa. Tenho outros blogs onde já publiquei poemas, mas este aqui não é pra isso. O que pega também é que é realmente um exercício, pois sou naturalmente da poesia. Então não vou negar que a prosa, apesar de me atrair muitíssimo, ainda me é espinhosa. No sentido de não ser habitual. Daí a necessidade do exercício e da consequente disciplina para escrever. Porque poesia você não senta para escrever com hora marcada. A poesia é que pára o que você estiver fazendo. Isso até acontece para reescrever, dar forma final ou descartar mesmo – mas, prosa, penso que esse é o primeiro e contínuo movimento.
O outro motivo que me traz de volta aqui é um artigo de 2007 que li agora, do Júlio Daio Borges, no Suplemento, com o título: “Publicar em papel? Pra quê?” no qual ele aponta que quem escreve em blog não necessariamente tem que chegar ao livro, que o público-alvo do blogueiro é atingido mais certeiramente na Internet que nas livrarias. ‘Blogueiros-escritores’, bem entendido. Então, às voltas com um livro que foi concebido para o papel e que já está na posição de nascer – me dei conta de que tenho um blog (mas quem não tem!) e preciso me mostrar, em dois sentidos: divulgar o que escrevo e divulgar meu nome. Porque acredito na auto-publicação em detrimento de leis de incentivo e ‘dificuldades de publicar por alguma editora’.
E o terceiro motivo: é porque está chovendo. E escrevi isto para alguém, que vocês lerão no lugar dela:
Você era meu sonho de consumo. Inalcançável. Estava sempre lendo. Reparei que era a mesma autora, invariavelmente. Impliquei com isso, mas eu também, na rua, me veem lendo ou quadrinhos, ou jornal. Que é o que minha concentração débil aguenta em meio à agitação. Jamais me verão lendo Clarice Lispector num banco de rodoviária. Loura. Quase ruiva. Alta. Inteligente. Como sei disso sem nunca ter lhe falado? Pelo olhar. Olhar perscrutador. Superior, até. Mas seus olhos sorriam sempre. Não um sorriso de ‘pode se aproximar’ ou de ‘você não tem chance’. Era mais ‘eu sei que você sabe apreciar a beleza e eu sei que sou bela e concedo que você me aprecie’. Claro, o sentimento era mais sucinto; para descrever é que gastam-se muitas palavras. Nossos olhares se cruzaram várias vezes, e eles nunca caíram em terra infértil. Quero dizer: você no papel de musa, eu no papel de poeta, porém sem ultrapassar esse limite. Eu sabia o seu nome e o seu sobrenome – estudamos na mesma escola. Paixão de corredor. Sei que você espera um final feliz pra esta história, e eu também espero. Sendo que eu nem posso dizer o nome dos personagens, nossos nomes. Por ora, o que posso dizer é que finalmente a vejo de uma distância menos segura. E você também. Ultrapassamos o limite. Daqui estamos por nossa conta. O que vai acontecer – ou não vai – está nas nossas mãos. Eu larguei o lápis e a paleta. Você despiu o olhar. Se nos vissem agora pensariam sermos velhos amantes. Que estão a ponto de se (re)encontrar. Mas o que eles não sabem, e nem nós ainda, é que o amor

Do latim (Beta)

Lucas Cranach, WikiArt.org

Lucas Cranach, Fall of man WikiArt.org

Grata brevitas, grata novitas¹

Muito tempo relutei em começar este texto com Muito tempo relutei. Isto é de algum romance do Machado… Já sei: Memórias póstumas… “Algum tempo hesitei…” Na verdade o que sempre me acontece é que escrevo o texto e, na hora de lhe dar um suporte – no caso, o blog –, sempre perco um tempo danado formatando o tal blog. Dar título a textos já é complicado – acho mais fácil partir do título –, imagina dar nome pro blog que vai se inflar de vários textos. Então descobri, lapidei este nome que casa bem com o que aqui vou publicar. O nome/frase vem do filme “Viajo porque preciso, volto porque te amo”. Que por sua vez vem de pára-choque de caminhão, que vem da porta de um puteiro de beira de estrada. Aí encasquetei que o endereço do blog devia ter latim e cismei com uma expressão que não conhecia e cujo significado é-me completamente novo e surpreendente: felix culpa. Que vem a ser a ‘culpa feliz’ de Adão após provar o fruto proibido, conhecer o pecado e ser expulso do paraíso. Culpa feliz esta que nós herdamos – ou vai dizer que você não sai com a cara mais lavada do mundo depois de uma luta no tatame? Pra minha sorte o nome já estava sendo usado numa canção gospel, por um grupo de rock e uma trupe de teatro. Porque faria pouco sentido ter o endereço do blog diferente do título. Então chegamos aqui neste texto que não era para ser o primeiro nem deveria ser publicado ainda em 2014. Imitação das famosas explicações machadianas com os seus Ao leitor? Não foi intencional. Mas precisava justificar algumas coisas – a razão do blog, o porquê do nome e o latim. Começo pra valer no próximo post. Inté!

¹Brevidade e novidade muito agradam